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sexta-feira, 3 de junho de 2011

Sessenta e Quatro Casas

__Não desembainhai vossas espadas! Abandonai vossas lanças e machados!__ proclamou o rei, a plenos pulmões, aos seus homens, no campo de batalha.

Todos se entreolharam surpresos e um ruidoso murmúrio percorreu as fileiras. Tinham escutado bem? Abandonar as armas, bem ali, diante do inimigo? O que tinha em mente, agora, aquele soberano, tão beligerante em suas decisões? Na véspera da batalha, havia rejeitado com veemência a trégua...

O medo e a confusão assaltaram a tropa. Em vão, os comandantes tentavam acalmar os ânimos mais exaltados. O líder muito amado parecia deixar seus guerreiros entregues a própria sorte...

__Rendição?! __inquietou-se um espadachim.

__O rei enlouqueceu?! __gesticulou o porta-estandarte.

__Ele nos abandonou! __odiou o piqueiro.

__Isso é covardia!!! __esbravejou um cavaleiro.

__Herege!!! __condenou o bispo.

__Senhor! O inimigo não terá compaixão! __engoliu seco um arqueiro.

__E nossas terras, esposas e filhos?! __implorou o escaramuçador.

__Que morra sozinho! __escarneceu um pagem.

Enquanto se levantavam cada vez mais raivosos, os protestos, uma sentinela sinalizava no alto de uma torre, a rápida aproximação do exército inimigo em grande formação cerrada...

A rainha, antes de partir, comovida, agarrou o braço de seu marido. Quisera saber o porquê daquela decisão. Por que arriscar tanto, a vida de tantos? E a própria vida? Não se importava mais com ela? Não amava mais a sua mulher?

O monarca endereçou à esposa um olhar de compaixão. Tocou no rosto da amada e sorriu com tristeza. Não se despediu. Afastou-se dalí, montado em seu cavalo que fora posto em marcha à frente de seus vassalos.

Com destemor, encarou o adversário. Ergueu sua espada reluzente e arremessou-a para longe.

__Quem me segue!?__ perguntou aos seus, com altivez.

Um silêncio sepulcral fora ouvido.

__Quem me segue?! __ e mais uma vez a pergunta não encontrou o que procurava.

E, no meio da tropa, houve quem erguesse voz ousada e atrevida, mais alta que as outras...

__Dane-se o rei! Carga total! __ era um de seus generais, montado em alvoroçado corcel negro. __ Avançar!!! Avançar!!!

A cavalaria pesada lançou-se delirante em direção ao flanco esquerdo da força oponente. O chão estremeceu sob os cascos. Cavaleiro e cavalo como única besta, num galope infernal...

A infantaria, por sua vez, contagiada pela euforia do general traidor, brandiu as armas, ensandecida. __A vitória ou a morte!!! __urraram em uníssono. Os clarins estridentes e os tambores de guerra soaram em ritmo acelerado.

A massa, antes compacta, após o choque frontal das armas, quebrou a formação. Todos ficaram mortalmente expostos ao ataque inimigo. Uma luta acirrada, desesperada, espalhou-se pelo campo. Impotente, o rei viu a carnificina recair por sobre seus homens apavorados. Quiseram recuar, mas era tarde...

__Xeque-mate! __vibrou Cicinho, meu amigo.

__Hum?

__Há! Xeque-mate! Olha aí, rapaz! Num tem saída!

__É... pelo visto, fechasse legal...

__O lance foi o teu cavalo. Movesse pra casa errada...

__Foi sim... Vacilo meu... __lamentei.

__Vamo outra que essa foi rápida.

__Tô afim não.

__Iiihhh... Que morgação é essa, meu velho... Ainda tás com aquela história na cabeça? Já disse, calma... deixa pra lá... curte o momento... Guardar raiva adoece a gente. Não é isso que você vive me dizendo?

__É... Mas, falar é fácil. Ficar calmo e aceitar são outros quinhentos... Certo?

__Relax my friend... Te convidei pra vir aqui em casa, pra esparecer a cuca... Toma teu refri sossegado e vamos fazer um brinde à...

__Paz? __arrisquei na resposta, um tanto irônico.

__Boa! __aplaudiu Cicinho. __Brindemos à paz em nós, porque este mundo tá muito louco. Que o bicho-homem possa deixar as guerras restritas apenas aos tabuleiros de xadrez!

__"Tin-tin", então...

Depois do brinde, derrubei o meu rei de cedro, no tabuleiro...

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